O humor é uma arma de arremesso, é agressão para diversão.
A sátira é feita de humor.
A sátira é de quem a produz também sobre si mesmo.
Na sátira imita-se a realidade, distorcendo-a, falseando-a.
Satiriza-se um político, um clérigo, um poeta, colocando-lhes
elementos insólitos no corpo, na roupa, nas palavras e nos tiques.
A sátira destrói – ou valoriza, glorificando –
uma pessoa, uma personagem, um grupo, uma corrente sanguínea.
A sátira, escrita ou representada, é espectáculo.
O riso é uma forma de agressão, por isso no riso se mostram os
dentes, com destaque para os incisivos, arma incorporada para
morder e matar a presa. Ou para defesa.
Há macacos que, por medo, riem. A ameaça dos cães rosnando é um
riso.
A sátira é a criação de uma segunda realidade, que começa
dependente do objecto satirizado e depois se autonomiza.
Há mecanismos fisiológicos que provocam alívio e bem-estar pela
descarga de adrenalina própria do acto hepático de rir.
E também nas situações angustiantes: um sketch do Mr. Bean é
inquietante e provoca ansiedade, pois há sempre uma derrocada pelo
falhanço e vigarice, depois ardilosamente compensados, e um
sofrimento em cadeia. O que alivia é um sucesso final conseguido
- expectável – do protagonista.
Tal como acontece com os clássicos Beny Hill ou Monty Python.
Com eles há uma sensação de perigo iminente, é o cómico como
reverso da medalha do trágico: veja-se, por exemplo, a velha série
televisiva Alô, Alô, com a guerra em pano de fundo e o risco da
«Resistência» ser apanhada.
Também o próprio Chaplin está sempre em perigo, a qualquer
momento pode cair, ser preso, espancado, ficar desempregado ou
perder o amor.
Outro exemplo de agressão contra a ortodoxia é a cena hilariante e
trágica – emblemática, esta - dos Monty Python: Ministery of silly
walks. Com o andar desengonçado de todas as personagens do
sketch tudo se vai partir, desfazer - o ministério, as pernas, as
palavras, os gestos ou o chá que se desmorona com a secretária que o
serve.
O maior riso é provocado pelo alívio de ver nos outros aquilo que
queremos que não nos aconteça, por exemplo, uma queda aparatosa,
que provoca riso, não apenas no mundo artístico, mas também na
crueldade quotidiana.
Esconjura-se o mal tal como se esconjura a morte, «foi o outro que
morreu, não eu», o que por vezes origina grupinhos de riso e
anedotas privadas em velório de funeral.
A poesia satírica tem alguns pontos de contacto com estas situações,
quer no tradicional escárnio, quer nos comportamentos das
personagens-tipo-alvo. Ou nos tipos aperaltados de Nicolau
Tolentino «os outros é que são párias ignóbeis, não eu poeta
(ou também «eu» pela parte que me toca?).
Ó Roque, com franqueza:
você nunca quis ver outros países?
- Bem queria, sr. O'Neill! E ... as varizes?
Quem tem varizes que o impedem de viajar é o Roque, não o
O’Neill, a quem apesar da ternura melancólica não se nega laivos de
crueldade fina: «Groselha na esplanada , bebe a velha»
2 comentários:
Interessante, sobre o humor e a sátira e o riso...
aprendi muito
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